OS PAIS DA IGREJA PRIMITIVA ENSINARAM AS DOUTRINAS CALVINISTAS?

Esta informação histórica pode ser útil na sua busca pela perspectiva soteriológica mais sólida. Mesmo o notável historiador calvinista, Loraine Boettner, admitiu: “Esta verdade fundamental [calvinismo] do cristianismo foi primeiramente ensinada claramente por Agostinho, o grande teólogo cheio do Espírito do Ocidente”.

Considere este artigo produzido por Tim Warner em 2003:

Antes dos escritos de Agostinho, a Igreja sustentava universalmente que a humanidade tinha um livre arbítrio. Cada homem era responsável diante de Deus para aceitar o Evangelho. Seu destino final, enquanto totalmente dependente da graça e do poder de Deus, também dependia de sua livre escolha de submeter-se ou rejeitar a graça e o poder de Deus. Nos três séculos dos Apóstolos a Agostinho, a Igreja primitiva não considerou NENHUM dos cinco pontos do Calvinismo. Os escritos da Igreja ortodoxa, durante os primeiros três séculos, estão em contraste com as ideias de Agostinho e Calvino. O homem é plenamente responsável por sua escolha para responder ou rejeitar o Evangelho. Esta era considerada a doutrina apostólica transmitida através dos anciãos da igreja local ordenados pelos Apóstolos e seus sucessores. Abaixo temos listado algumas citações representativas dos escritores anteriores, a fim de dar o sabor da tradição mais antiga em relação à eleição e livre arbítrio. Alguns lidam com o tema da perseverança e apostasia.

Clemente de Roma (30-100 D.C.)

“Devido à sua bondade e piedade, Ló foi salvo de Sodoma quando toda a região foi castigada por meio de fogo e enxofre, demonstrando assim o Senhor que não abandona os que nele colocam a sua esperança, mas que entrega os que se apartam dele ao castigo e à tortura. Assim a mulher de Ló, que o acompanhava, tendo uma opinião diferente dele e não continuando em acordo com ele [relativamente à ordem que tinham recebido], tornou-se um exemplo, convertida em estátua de sal até hoje. Isto aconteceu para que todos saibam que os que duvidam, e não confiam no poder de Deus, fazem cair julgamento sobre si próprio e convertem-se em sinais para as gerações seguintes. (Clemente, Epístola aos Coríntios, XI)

Inácio de Antioquia (30-107 D.C.)

“Sabendo então que todas as coisas têm um fim, e que perante nós está proposta a vida mediante obediência [a Deus], ou a morte com resultado da desobediência, e cada um, de acordo com a escolha que faça, irá ao seu próprio destino, fujamos da morte, e escolhamos a vida. Pois digo-vos que há duas personalidades entre os homens: um é como moeda verdadeira, e o outro como moeda falsa. O homem verdadeiramente devoto é como a moeda verdadeira, cunhada pelo próprio Deus. O ímpio é moeda falsa, desleal, espúrio, falsificado, cunhado não por Deus mas pelo diabo. Não digo que haja duas naturezas, mas que há uma humanidade, uns pertencendo a Deus, outros ao diabo. Quem for verdadeiramente piedoso, será homem de Deus; mas se for impiedoso será homem do diabo, assim feito não por natureza, mas pela sua própria escolha. O descrente é cunhado com a imagem do príncipe da maldade. O crente traz em si a imagem do seu Príncipe, Deus Pai, e Jesus Cristo Através de quem, se não estamos prontos para morrer pela verdade em Sua paixão, Sua vida não está em nós “. (Epístola aos Magnésios, V)

Barnabé (100 D.C.)

O Senhor julga o mundo sem acepção de pessoas; cada homem receberá de acordo com as suas obras. Se for reto, a sua retidão irá à sua frente; se for mau, a recompensa da sua impiedade o acompanhará. Cuidado, pois, para que não nos descuidemos por termos sido chamados [por Deus], que não adormeçamos no pecado, e o malvado príncipe, recebendo poder sobre nós, nos atraia para fora do reino do Senhor. Além disso, atentai nisto, irmãos meus: que depois de tão grandes sinais e maravilhas feitos em Israel, acabaram eles por serem desamparados. Cuidai então para que não cumprais a escritura que diz “muitos são chamados, mas poucos os escolhidos”. (Epístola de Barnabé, IV)

Justino Mártir (110-165 D.C.)

Do que dissemos anteriormente, ninguém deve tirar a conclusão de que afirmamos que tudo o que acontece, acontece por necessidade do destino, pelo fato de que dizemos que os acontecimentos foram conhecidos de antemão. Por isso, resolvemos também essa dificuldade. Nós aprendemos dos profetas e afirmamos que esta é a verdade: os castigos e tormentos, assim como as boas recompensas, são dadas a cada um conforme as suas obras. Se não fosse assim, mas tudo acontecesse por destino, não haveria absolutamente livre-arbítrio. Com efeito, e já está determinado que um seja bom e outro mau, nem aquele merece elogio, nem este, vitupério. Se o gênero humano não tem poder de fugir, por livre determinação, do que é vergonhoso e escolher o belo, ele não é irresponsável de nenhuma ação que faça. Mas que o homem é virtuoso e peca por livre escolha, podemos demonstrar pelo seguinte argumento: vemos que o mesmo sujeito passa de um contrario a outro. Ora, se estivesse determinado ser mau ou bom, não seria capaz de coisas contrárias, nem mudaria com tanta frequência. Na realidade, nem se  poderia dizer que uns são bons e outros maus, desde o momento que afirmamos que o destino é a causa de bons e maus, e que realiza coisas contrárias a si mesmo, ou que se deveria tomar como verdade o que já anteriormente insinuamos, isto é, que virtude e maldade são puras palavras, e que só por opinião se tem algo como bom ou mau. Isso, como demonstra a verdadeira razão, é o cúmulo da impiedade e da iniquidade. Afirmamos ser destino iniludível que aqueles que escolheram o bem terão digna recompensa e os que escolheram o contrario terão igualmente digno castigo. Com efeito, Deus não fez o homem como as outras criaturas. Por exemplo: árvores e quadrúpedes, que nada podem fazer por livre determinação. Nesse caso, não seria digno de recompensa e elogio, pois não teria escolhido o bem por si mesmo, mas nascido já bom; nem, por ter sido mau, seria castigado justamente, pois não seria livremente, mas por não ter podido ser algo diferente do que foi. (Justino, Primeira Apologia, XLIII)

Com efeito, nos dizemos que acontecerá a conflagração universal, mas não, como dizem os estoicos, por causa da transformação de umas coisas em outras, pois isso nos parece muito torpe. Também não dizemos que os homens agem ou sofrem por necessidade do destino, mas cada um agem bem ou peca por sua livre determinação. Acrescentamos ainda que, por obra dos perversos demônios, homens bons, como Sócrates e outros semelhantes, foram perseguidos e aprisionados, e, ao contrário, Sardanapalo, Epicuro e outros da sua laia viveram, ao que parece, na abundancia, glória e felicidade. Não entendendo isso, os estoicos disseram que tudo acontece por necessidade do destino. Mas não é assim. No principio, Deus criou livres tanto os anjos como o gênero humano e, por isso, receberam com justiça o castigo de seus pecados no fogo eterno. A natureza de tudo o que tem principio é esta: ser capaz de vicio e de virtude, pois ninguém  seria digno de louvor se não pudesse também voltar-se para um desses extremos. Demonstram isso aqueles homens que, em todas as partes, legislaram e filosofaram  conforme a reta razão, ao mandarem que se façam algumas coisas e se evitem outras. Os próprios filósofos estoicos, em sua doutrina sobre costumes, têm em alta estima esses mesmos princípios.  Isso prova que eles não no caminho certo na sua metafisica sobre os princípios e o incorpóreo. De fato, ao dizer que tudo o que os homens fazem acontece por necessidade do destino ou que Deus não é outra coisa senão isso que constantemente se muda,  se patente que têm ideia apenas do corruptível e que Deus, em suas partes e como todo, se produz em meio a toda maldade ou, por fim, que a virtude e a maldade nada são. Isso choca-se contra toda ideia prudente, contra toda razão e inteligência. (Segunda Apologia de Justino, VII)

Não poderia Deus no principio ter eliminado a serpente, para não ter que dizer: ”Porei inimizade entre ti e a mulher, e entre a tua descendência e a dela?” Não poderia Deus criar imediatamente uma multidão de homens? Todavia, como ele sabia que era coisa boa, criou os anjos e os homens livres para realizar o bem e determinou os tempos até o momento que ele sabe que será bom eles possuírem livre-arbítrio. E porque igualmente considerou bom, estabeleceu julgamentos universais e particulares, embora sem atentar contra a liberdade. (Justino, Diálogo com Trifão, 102)

Eu me adiantarei para dizer poucas palavras que Deus, querendo que anjos e homens seguissem o bem, dotados de razão para conhecer de onde vêm e a quem deve o ser que antes não tinham, e lhes impôs uma lei, pela qual serão julgados, caso não t3enham agido conforme a reta razão. Portanto, por nossa própria culpa seremos convencidos de ter sido maus, homens e anjos, se antes não fizermos penitencias. Contudo, se a palavra de Deus anuncia absolutamente que alguns anjos e homens serão castigados, isso foi predito porque ele de antemão conheceu que seriam maus e não se arrependeriam, não, porém, porque o próprio Deus assim os fizesse. (Justino, Diálogo com Trifão, 141)

“Aqui, portanto, é uma prova de virtude e de uma prudência amorosa, recorrer à comunhão da unidade e unir-se à prudência para a salvação, e fazer a escolha das melhores coisas de acordo com o livre-arbítrio Colocado no homem; E não pensar que aqueles que são possuídos de paixões humanas são senhores de todos, quando eles não parecem ter o mesmo poder com os homens.” (Justino, On the Sole Government of God, VI)

 

Irineu (120-202 D.C.)

As palavras que diz: “Quantas vezes quis reunir os teus filhos e não quiseste”, ilustram bem a antiga lei da liberdade do homem, porque Deus o fez livre desde o inicio, com a sua vontade e a sua alma para consentir aos desejos de Deus sem ser coagido por ele. Deus não faz violência, e o bom conselho o assiste sempre, e por isso da o bom conselho a todos, mas também da ao homem o poder de escolha, como o dera aos  anjos, que são seres racionais, para que os que obedecem recebam justamente o bem, dado por Deus e guardado para eles enquanto os desobedientes serão justamente frustrados nesse bem e sofrerão o castigo merecido. Pois Deus, na sua bondade, lhes dera o bem, mas eles não o guardaram com diligencia e não o julgaram precioso e até desprezaram a excelência da sua bondade. Abandonando e recusando o bem incorrerão no justo juízo de Deus, como o testemunha o apóstolo Paulo na carta aos Romanos, quando diz: “será que desprezas a riqueza de sua bondade, da paciência e da generosidade, desconhecendo que a bondade de Deus te convida à conversão? Pela teimosia e dureza de coração amontoa ira contra ti mesmo para o dia da ira e  da revelação do justo julgamento de Deus”. “A gloria e a honra, diz, são para todos os que fazem o bem”.

Portanto, Deus ofereceu o bem, como o testemunha o apóstolo Paulo na carta mencionada, e os que o praticam receberão glória e honra por tê-lo feito, quando podiam não fazê-lo; os que não fazem receberão o justo julgamento de Deus por não ter feito o bem que podiam fazer.

Se, por natureza, alguns fossem bons e outros maus, nem aqueles seriam louváveis por serem bons, porque nasceram assim, nem estes seriam condenáveis por que foram feitos assim. Mas como todos são da mesma natureza, capazes de possuir e operar o bem e capazes de perdê-lo e de não fazê-lo, os que escolheram e perseveram no bem recebem digno testemunho por isso, e são justamente louvados pelas pessoas sensatas – e muitos mais por Deus – os outros são repreendidos e recebem a merecida infâmia por terem recusado o bem e o justo. Por isso os profetas exortavam os homens a praticar a justiça e a fazer o bem, como abundantemente demonstramos porque está em nós, mas visto que pela nossa negligencia nos esquecemos facilmente e precisamos de bom conselho, o bom deus no deu bom conselho por meio dos profetas. …É possível também não seguir o evangelho, se alguém assim quiser, contudo não é conveniente. A desobediência a Deus e a recusa do bem estão em poder do homem, mas comportam prejuízo e castigo indiferentes. … Sendo, porém, o homem livre na sua vontade, desde o principio, e livre é deus, à semelhança do qual foi feito, foi-lhe dado, desde sempre, o conselho de se ater ao bem, o que se realiza pela obediência a Deus.

Não somente nas ações, mas também na fé, o senhor deixou livre e independente o arbítrio do homem. Ele disse: “Seja-te feito segundo a tua fé”, mostrando que a fé é própria do homem, pois tem o poder de decidir. E ainda: Tudo é possível para quem crê. E mais: “Vai, e te seja feito conforme acreditaste”. E todos os textos análogos que mostram o homem livre em relação a fé. Por isso “aquele que crê nele tem a vida eterna, mas aquele que não crê no Filho, não terá a vida eterna, mas a ira de Deus ficará sobre ele”. Segundo este principio, indicando ao homem seu verdadeiro bem e afirmando ao mesmo tempo a sua liberdade de arbítrio e de poder, o senhor dizia a Jerusalém : “ Quantas vezes quis reunir os teus filhos, como a falinha recolhe os pintinhos debaixo das asas, e não quiseste”. “Eis por que a vossa casa será deixada deserta”. (Irineu, Contra as Heresias, Livro, IV, 37)

A passagem acima é imediatamente seguida pela refutação de Irineu dos cultos gnósticos que “mantêm o oposto dessas conclusões”.

O que dizer? Que o verbo veio para a ruina e a ressureição de muitos: para a ruina dos que não creem nele e que ameaçou, no dia do juízo, de uma pena mais severa do que aquela de Sodoma  e Gomorra; e para a ressurreição dos que creem e obedecem à vontade de seu Pai que está nos céus. Se o Filho veio para todos igualmente, mas julga e distingue os que creem dos que não creem – porque espontaneamente os que creem fazem a sua vontade e espontaneamente os que não creem não recebem os seus ensinamentos – esta claro que o Pai criou todos iguais, cada um possuindo o seu poder de decisão e seu livre-arbítrio, mas vê tudo e providencia para todos e “faz nascer o sol sobre os maus e os bons e faz chover sobre os justos e os injustos”.

E a todos os que guardam o seu amor oferece e sua comunhão; a comunhão de Deus é vida, é luz, é gozo dos bens que veem dele. Para aqueles, porém, que por sua própria vontade se afastam dele, conforma a separação que escolheram; a separação de Deus á a morte, a separação da luz são as trevas, é a perda de todos os bens que vêm dele. Os que, portanto, pela sua apostasia, perderam tudo o que acabamos e dizer, sendo privados de todos os bens, estão imersos em todos os castigos, não porque Deus não tivesse no principio a intenção de puni-los, mas o castigo veio como consequência da privação de todos os bens. Os dons de Deus são eternos e sem fim e a privação deles é também eterna e sem fim, como os que se auto cegaram por uma luz violenta ou o foram por outros, estão privados permanentemente do gozo da luz, não porque a própria luz cegue, mas porque sua cegueira aumenta a sua desgraça. Por isso o Senhor dizia: “Quem crê em mim não é julgado”, isto é, não é separado de Deus, porque está unido a Deus pela fé. E acrescentava: “Mas quem não crê já esta condenado porque não céu no nome do Unigênito Filho de Deus”, isto é  separou-se de Deus por sua livre decisão. “Este é o julgamento: a luz veio ao mundo, mas os homens preferiram as trevas à luz. Quem faz o mal odeia a luz e não vem para a luz, a fim de que as suas obras não sejam desmascaradas. Mas quem pratica a verdade vem para a luz, a fim de que se manifeste que as suas obras são feitas em Deus”.(Irineu, Contra Heresias, livro.V, XXVII)

Taciano (110-172 D.C.)

“Por que você está destinado a compreender as coisas com frequência, e muitas vezes a morrer? Morrer para o mundo, repudiando a loucura que está nele. Viver para Deus, e apreendê-lo deixa de lado a sua velha natureza. Não fomos criados para morrer, mas morremos por nossa culpa. Nosso livre-arbítrio nos destruiu; Nós que estávamos livres nos tornamos escravos; Fomos vendidos pelo pecado. Nada de mal foi criado por Deus; Nós mesmos temos manifestado a iniquidade; Mas nós, que a manifestamos, podemos novamente rejeitá-la. “(Taciano, Discurso aos gregos, XI)

Tertuliano (145-220 D.C.

“Além disso, o homem assim constituído será protegido tanto pela bondade de Deus como pelo Seu propósito, os quais são sempre encontrados de acordo com nosso Deus. Pois Seu propósito não é propósito sem bondade; Nem é Sua bondade sem um propósito, exceto para o caso do Deus de Marcião, que é desnecessariamente bom, como temos mostrado. Bem, então, era apropriado que Deus fosse conhecido; Era sem dúvida uma coisa boa e razoável. Também era apropriado que houvesse algo digno de conhecer em Deus. O que poderia ser achado tão digno como a imagem e semelhança de Deus? Isso também foi, sem dúvida, bom e razoável. Portanto, era apropriado que (Ele que é) a imagem e a semelhança de Deus fossem formadas com o livre arbítrio e domínio próprio; De modo que esta mesma coisa – ou seja, a liberdade de vontade e auto-determinação – pode ser reconhecida como a imagem e semelhança de Deus nele. Para este propósito, tal essência foi adaptada ao homem como adequado a este caráter, igualmente a inspiração da Deidade, Nele mesmo livre e não determinado. Mas se você entender por outro ângulo a questão, como aconteceu que aquele homem, quando possuía todo o mundo, não dominou sobre tudo devido a seu domínio próprio – um mestre sobre os outros, um escravo de si mesmo? A bondade de Deus, então, você pode aprender com o Seu dom gracioso para com o homem, e o propósito de Sua vontade de todas as coisas. No presente, deixemos somente a bondade de Deus ocupar nossa atenção, a qual deu tão grande dom ao homem, até a liberdade de sua vontade. O propósito de Deus reivindica alguma outra oportunidade de tratamento, oferecendo seu ensino de igual importância. Agora, só Deus é bom por natureza. Pois é Ele, que não possui inicio, não foi criado por natureza. O homem, entretanto, que existe inteiramente por criação, tendo um começo, junto com o principio obteve a forma em que ele existe; E assim ele não possui, por natureza, disposição para o bem, mas pela criação, não tendo como seu atributo próprio o ser bom, porque (como dissemos) não é por natureza, mas pela criação, que ele está disposto para o bem, de acordo com a designação de seu bom Criador, igualmente o Autor de todo o bem. Portanto, para que o homem pudesse ter um bem próprio, concedido a ele por Deus, e ali pudesse haver doravante no homem uma característica e, em certo sentido, um atributo natural da bondade, lhe foi outorgado na constituição da sua natureza, como um testemunho explicito da bondade que Deus lhe concedeu, a liberdade e o poder da vontade, que devem fazer com que o bem seja realizado espontaneamente pelo homem, como algo próprio, com o fundamento de que nada menos do que isto seria exigido em matéria de bondade que seria voluntariamente exercida por ele, isto é, pela liberdade de sua vontade, sem qualquer favor ou subserviência à constituição de sua natureza, para que o homem fosse bom apenas até este ponto, se ele deve mostrar sua bondade de acordo com sua constituição natural, mas ainda como resultado de sua vontade, como algo inerente de sua natureza; E por um similar exercício de volição, deve mostrar-se demasiado forte na defesa contra o mal também (porque mesmo isto, é claro, Deus previu), sendo livre e mestre de si mesmo; Porque, se ele quisesse nesta prerrogativa de autodomínio, de modo a realizar mesmo o bem pela necessidade e não pela vontade, estaria, na impotência de sua servidão, sujeito à usurpação do mal,  um escravo tanto do  mal como do bem. Toda a liberdade de vontade, portanto, foi lhe conferida com ambas as tendências; Para que, como dono de si mesmo, encontrasse sempre o bem pela observação espontânea disso, e o mal por sua evasão espontânea; Porque, se o homem estivesse em outra circunstância, era ainda seu dever, no julgamento de Deus, fazer justiça de acordo com as ações da disposição de sua vontade, naturalmente, como livres. Mas nenhuma recompensa, de bem ou mal poderia ser paga ao homem que porventura for encontrado sendo bom ou mau por necessidade e não por escolha. Nisso está realmente à lei que não exclui, mas sim prova a liberdade humana por uma intenção espontânea de obediência, ou por cometer espontânea iniquidade; Tão patente era a liberdade da vontade do homem para qualquer questão. Dado que, portanto, tanto a bondade quanto o propósito de Deus são revelados no dom ao homem da liberdade em sua vontade, não é correto, depois de ignorar a definição original de bondade e propósito que era necessário determinar antes de qualquer discussão da pessoa, em fatos subsequentes, a presumir e dizer que Deus não devia desta maneira ter formado o homem, porque a questão era diferente do que se supunha ser apropriado para Deus. Deveríamos, depois de considerar adequadamente que Deus devia criar o homem, deixar essa consideração intacta e examinar os outros aspectos do caso. É, sem dúvida, um processo fácil para as pessoas que se ofendem com a queda do homem, antes de examinarem os fatos de sua criação, atribuir à culpa do que aconteceu. (Tertuliano, Contra Marcião, Livro II, cap. Vl)

“Deus colocou a questão [a Adão -” onde você está “] com uma aparência de incerteza, a fim de que, mesmo aqui, Ele possa provar que o homem é uma pessoa com livre arbítrio, tendo a alternativa de negar ou confessar, e Dar-lhe a oportunidade de reconhecer livremente a sua transgressão, e, até agora, de iluminá-la. Da mesma maneira, pergunta a Caim onde estava seu irmão, como se ainda não tivesse ouvido o sangue de Abel clamando da terra, para que ele também tivesse a oportunidade do mesmo poder da vontade de negar espontaneamente e a este grau agravante de seu crime; E para que assim pudéssemos nos prover exemplos de confessar pecados ao invés de negá-los; de modo que assim foi iniciada a doutrina evangélica: “Por tuas palavras serás justificado, e por tuas palavras serás condenado” (Tertuliano , Contra Marcião, Livro. II, XXV)

 

“O homem rico seguiu seu caminho desde que não” aceitou” o ensinamento de dividir sua fortuna com o necessitado, e foi abandonado pelo Senhor por sua própria opinião. Nem  a “severidade” da vontade será por esse motivo imputada a Cristo, nem o fundamento da ação viciosa do livre-arbítrio de cada individual. “Eis aqui”, diz Ele, “Eu pus diante de vós o bem e o mal”. Escolham o que é bom: se você não escolher é  porque não  quer – pois  você  pode se quiser, ele tem  mostrado, pois ele tem proposto a cada um devido a seu livre arbítrio – você deve se afastar daquele cuja vontade não quer. “(Tertuliano, Sobre Monogamia, XIV)

Clemente de Alexandria (153-217 D.C.)

“Deus, então, é bom. E o Senhor fala muitas vezes e frequentemente antes de agir. … Porque Deus não está zangado da maneira que alguns pensam; Mas muitas vezes restringe, e sempre exorta a humanidade, e mostra o que deve ser feito. E este é um bom instrumento, para amedrontar nos, a fim de que não pequemos. “Porque o temor do Senhor afasta os pecados, e o que não tem temor não pode ser justificado”, diz a Escritura. E Deus não inflige castigo da ira, senão pelos fins da justiça; Pois não é oportuno que a justiça seja negligenciada por nossa conta. Cada um de nós, que pecamos, com seu livre arbítrio escolhe o castigo, e a culpa é daquele que escolhe. Deus é sem culpa. “Mas se a nossa injustiça nos entrega a justiça de Deus, que diremos? Deus é injusto, por buscar vingança? Deus não permita “. … Está claro, então, que aqueles que não estão em inimizade com a verdade, e não odeiam a Palavra, não odiarão sua própria salvação, mas escaparão do castigo da inimizade. “A coroa da sabedoria”, como diz o livro da Sabedoria, “é o temor do Senhor”. Claramente, portanto, pelo profeta Amós, o Senhor revelou sua forma de tratar, dizendo: “Eu o tenho derrubado, Como Deus derrubou Sodoma e Gomorra; E sereis como um tição retirado do fogo; e ainda assim não voltastes a mim, diz o SENHOR. Vede como Deus, pelo seu amor à bondade, procura o arrependimento; E por meio do seu plano que Ele busca exortar silenciosamente, mostra Seu próprio amor pelo homem. “Eu afastarei”, Ele diz, “Meu rosto deles, e mostrarei o que lhes acontecerá.” Porque onde está o rosto do Senhor, há paz e alegria; Mas onde é rejeitado, há a introdução do mal. O Senhor, portanto, não deseja ver as coisas más; Porque Ele é bom. Mas ao desviar o olhar, o mal surge espontaneamente através da incredulidade humana. “Eis, pois, diz Paulo, a bondade e a severidade de Deus; sobre Eles caíram à severidade; Mas sobre ti, bondade, se continuares em Sua bondade “, isto é, na fé em Cristo.” (Clemente de Alexandria, The Instructor, livro.1, VIII)

Orígenes (185-254 D.C.)

A pregação eclesiástica também define que toda a alma racional possui livre-arbítrio e vontade, e que para ela há um combate contra o diabo e seus anjos, e contra os seus poderes adversos, que querem carregar a alma com pecados, mas que, se nós nos conduzirmos por uma vida reta e prudente conseguiremos nos livrar dessa mancha. Portanto, é preciso entender que não estamos submetidos à necessidade a ponto de ser constrangidos de qualquer modo, mesmo quando não o queremos, a fazer o bem, ou o mal. De fato, se assumirmos o nosso livre-arbítrio, por mais que certos poderes nos ataquem para nos conduzir ao pecado, e outros para nos ajudar na salvação, nem por isso somos obrigados a agir bem, ou mal – como opinam aqueles para os quais o movimento e percurso dos astros são a causa dos atos humanos, não só daqueles que ocorrem espontaneamente sem relação com o livre-arbítrio, mas também daqueles que estão ao nosso alcance. (Orígenes, Tratado sobre os Princípios, Prefácio)

É por isso que pensamos que Deus, pai de todas as coisas, para salvar todas as criaturas pelo inefável meio da sua palavra e sabedoria, dispôs cada coisa de tal maneira que cada espirito, mente, ou seja, como for que se chamem os seres racionais subsistentes, apesar da liberdade da vontade, não seja constrangido a fazer senão o que lhe ordena o ato da sua inteligência, pois, do contrario, parece que lhe seria retirada a faculdade do livre-arbítrio, e a qualidade da sua natureza seria totalmente modificada; mas ele preparou os diversos movimentos das suas intenções de modo adequado e com utilidade para assegurar a harmonia de um único mundo; assim, uns precisam de ajuda, outros podem ajudar, e outros levantam lutas e combates para os que têm condições de progredir e ficar mais firme depois da vitória, recuperando e assegurando sua condição pelas dificuldades e esforços. (Orígenes, Livro II, capítulo I)

Hipólito (170-236 D.C.)

“Mas o homem, pelo fato de possuir uma capacidade de autodeterminação, produz o que é mal, isto é, acidentalmente; mal este que não é consumado, exceto quando você efetivamente comete alguma maldade. Pois isso é em relação ao nosso desejo que alguma coisa é perversa ou nossa ponderação sobre isso, pelo qual o mal é assim denominado. O mal não possuía existência desde o início, mas veio a existir posteriormente. Uma vez que o homem tem livre arbítrio, uma lei foi definida para seu governo pela Divindade, não sem que houvesse um bom propósito. Pois se o homem não possuía o poder de querer e não querer, por que uma lei deveria ser estabelecida? Pois uma lei não será estabelecida para um animal desprovido de razão, mas um freio e um chicote; Enquanto que ao homem foi dado um preceito e uma penalidade para executar, ou para não executar o que foi ordenado. Para o homem assim foi constituído uma lei, a qual foi estabelecida para os homens justos em idades primitivas. “(Hipólito, Against all Heresies, Bk. X, ch. xxix)

Novaciano (210-280 D.C.)

“E para que, uma vez mais, uma liberdade ilimitada caia em perigo, Ele estabeleceu uma ordem, na qual o homem foi ensinado que não havia maldade no fruto da árvore; Mas ele foi avisado que o mal surgiria se por acaso ele pudesse exercer seu livre arbítrio, na desobediência da lei que foi dada. Pois, por um lado, tinha-lhe sido necessário ser livre, para que a imagem de Deus, inadequadamente, não estivesse em servidão; E, por outro lado, acrescentava-se a lei, de modo que uma liberdade desenfreada não pudesse romper até uma desobediência ao Doador. De modo que ele poderia receber como consequência, recompensas meritórias e um castigo merecido, tendo em seu próprio poder o que ele poderia escolher fazer, pela disposição de sua mente em qualquer direção: portanto, por inveja, a mortalidade voltasse para ele; Vendo que, embora pudesse escapar-lhe pela obediência, ele precipitadamente  apressou se a ser Deus sob a influência de conselhos perversos. “(Novaciano, Trinity, cap.1)

Arquelau (277 D.C.)

“Este relato também indica que as criaturas racionais foram confiadas com o livre arbítrio, em virtude do qual também admitem conversões.” … “Pois todas as criaturas que Deus fez, Ele fez muito bem; E Ele deu a cada indivíduo o senso de livre-arbítrio, de acordo com qual padrão Ele também instituiu a lei do juízo. O pecado é nosso, e quando nós não pecamos é dom de Deus, como nossa vontade é constituída para escolher pecar ou não. … Os juízes disseram: Ele deu demonstração suficiente da origem do diabo. E, como ambos os lados admitem que haverá um julgamento, ele está necessariamente envolvido na admissão de que cada indivíduo é manifesto ter livre arbítrio; E uma vez que isso é claramente evidenciado, não pode haver dúvida de que cada indivíduo, no exercício de seu próprio poder da vontade, pode moldar seu curso em qualquer direção que lhe agrade “. (Arquelau, The Acts of the Disputation)

Alexandre de Alexandria (273-326 D.C.)

“Eu me empenharei, com seu auxilio e favor, para examinar cuidadosamente a posição dos ofendidos, e negam que falamos a verdade, quando dizemos que o homem possui livre arbítrio e provar que” Eles perecem por si só, por sua própria culpa, “escolhendo o agradável em preferência ao conveniente.” Alexandre, Banquet of the Ten Virgins, Discourse VIII, ch. xii)

Lactâncio (260-330 D.C.)

“Quando, pois, o número de homens começava a aumentar, Deus na Sua presciência, para que o diabo, a quem desde o princípio Ele tinha dado poder sobre a terra, fosse por sua astucia corromper ou destruir os homens, como tinha feito anteriormente, enviou anjos para a proteção e beneficio da raça humana; E porquanto lhes deu livre arbítrio, ordenou-lhes, acima de todas as coisas, que não se corrompesse com a contaminação da terra e assim perdessem a dignidade de sua natureza celestial “(Lactâncio, Divine Institutes, Bk. II, ch. xv)

Parece não haver exceções entre os primeiros escritores cristãos ao ensino ortodoxo de que ao homem foi dado por Deus, o livre arbítrio para escolher o seu destino, e que a salvação está disponível para todos. A visão contrária, de que o homem é controlado pelo destino, só pôde ser encontrada nas escolas filosóficas gregas, no gnosticismo e no misticismo oriental durante os primeiros 300 anos do cristianismo. Não é de admirar que o homem que introduziu o fatalismo grego no cristianismo deveria vir de um fundo gnóstico e neoplatônico. A teoria de Agostinho diferiu dos filósofos gregos principalmente por nomear a CAUSA do destino – a vontade misteriosa de Deus que não deve ser questionada e não pode ser compreendida pelos mortais. O impacto do ensino de Agostinho provavelmente não teria sido tão grande se Pelágio não tivesse ido ao extremo oposto em renunciar a Agostinho.

Enquanto aqueles de crença reformada têm razão em rejeitar as heresias latinas de Roma, têm sido negligentes em reconhecer as heresias gregas introduzidas antes da era latina, que são igualmente contrárias à verdade da fé cristã “de uma vez por todas entregues aos santos” “Pelos Apóstolos de Jesus Cristo. Eles parecem ter uma opinião mais elevada de filósofos, como Agostinho, do que dos próprios Apóstolos e aqueles a quem os Apóstolos confiaram a tradição apostólica.

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